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Giordano Poloni |
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A minha crónica na Revista Caliban
Antónia, casada, quarenta e dois anos, desempregada, aos
trinta e cinco, a mãe, às portas da morte, chamou-a e disse-lhe:
- Não és minha filha, és adoptada, eu fui buscar-te, estavas
sujinha, tinhas uma marca na testa e estavas a fazer beicinho. És filha do meu
irmão, o teu tio.
- Mas os tios nunca me falaram, nem quiseram saber de mim,
nem quando tive sarampo e papeira…
A mãe adoptiva morreu. O resto da família sabia da história,
o “tio”, agora “pai”, só lhe disse olá
como estás pelo telefone e… Já sabes!
E a “tia”, agora “mãe”, disse-lhe que tinha que tratar do pai adoptivo que
estava com alzheimer. E ela, Antónia de seu nome, sem filhos, um marido
informático que mudou de emprego meia dúzia de vezes bem contadas, com o pai
adoptivo no lar, desempregada de longa duração, sem se dar com o sogro, com um
carro com quinhentos mil kilómetros comprado a um ajudante de mecânico para usar e deitar fora, já enervada com outras coisas da vida, a ter
vontade de fazer qualquer coisa que fizesse jorrar muito sangue com honras de
abertura de telejornal, apesar da sua entrega e generosidade, apesar do
voluntariado na associação recreativa do bairro, apesar do curso de formação,
partilhado com a Elvira, molestada em pequena, com dois filhos, um de cada pai,
psicóloga desempregada, que faz limpezas de vez em quando e quando a ciática
lho permite, mais o Francisco, designer, pintor, escultor, artista, fiel de
armazém nos últimos tempos antes do chapadão ao chefe, que vive no Sobral,
desenha, pinta, bebe uns copos e diz palermices que só o Alberto, ex-tipógrafo,
ex-bancário, ex-professor, escritor de vida adiada, acha graça. As horas
passam, os devaneios também, só o vazio sobra e a falta de paciência para acabar
de preencher o questionário do Centro de Emprego…