Preto e branco, assim estampado em grossa letra de imprensa na prata mágica do chocolate, sucedâneo das melhores marcas “à venda nas casas da especialidade”, que a mãe lhe comprava, numa memória longínqua, enrodilhada em café torrado e feijão branco a granel, na mercearia do senhor Rodrigues, encravada num prédio a cair de podre no declive acentuado da General Taborda, para as bandas de Campolide onde hoje funciona um banco, lembrava-lhe, com clareza, o gesto rotineiro do senhor Rodrigues ao balcão. Após as compras, sacava do rectângulo carcomido de madeira com uma mola a prender meia dúzia de folhas amarelecidas e enroladas onde assentava, no rol, as dívidas, os calotes e a vida da vizinhança penhorada de remedeio omnipresente. O melhor de tudo era quando o senhor Rodrigues oferecia um chupa daqueles coloridos , aos montes dentro dum boião enorme de vidro com tampa vermelha, embrulhado no cinismo das parcelas amontoadas a eito no rol. O chupa sabia a ginjas mesmo sem nunca as ter provado. Outro gesto rotineiro numa praxe instituída, eram os vinte e cinco tostões que a mãe dava sempre ao homem em cadeira de rodas, junto à berma, que se esquecera das pernas, numa mina cravada no meio do mato, naquele pontinho pintado a amarelo no globo terrestre com umas letras a dizer Guiné. Na chegada a casa, derretia paulatinamente o chocolate na companhia do Jornal do Cuto sob o pano de fundo do Simplesmente Maria do Rádio Clube Português.
Saudades… Tinha saudades das memórias doces, do cheiro do café, do chocolate…
Da Mãe…
Não há nada que se compare aos sabores e aos cheiros da infância! :)
ResponderEliminarGosto de te ver por aqui de novo! :))
Os odores conseguem transportar-nos.
ResponderEliminar:)