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terça-feira, 14 de abril de 2020

TRINCHEIRA DO AMOR


Michal Trpák


Escrevo com a pressa de quem foge, imprevisto mergulho na voragem da tua condescendência, em mais um dia de sol e quarentena, em rotundo esforço para pousar o comando da televisão  e desenfiar as nádegas do sofá. Tocam à porta. É o carteiro, não tenho correspondência, mas toca sempre para aqui para lhe abrir a porta, num prédio confinado a uma ausência prolongada. Continuo indiferente. Mudo os canais e fixo-me numa série cómica, abro um pacote de batatas fritas, cento e vinte gramas de polinsaturados, em óleo de girassol, trinta e cinco por cento de matéria gorda e hidratos, sem corantes, saído da fábrica da Póvoa de Santa Iria. Trinco uma. Esboço uma tentativa de gargalhada. Mudo de canal, um thriller; mudo novamente, um drama familiar que envolve traição, doença e arrependimento. Regresso à série cómica. Imagino que estás aqui, encostamo-nos e dormimos em elipse, no lugar da incerteza, trincheira do amor.
E chove, finalmente.

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